quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

O que é ser-se homossexual

Homossexualidade:

da perseguição à atualidade

Alexandre Magno (356 - 323), rei da Macedónia, foi um jovem vigoroso, de cabelos louros e frisados, com uma perso­nalidade fascinante, cuja imagem enamo­rou toda a antiguidade. Casou-se quatro vezes, mas de acordo com os costumes da época, também praticava a homossexuali­dade.
Conta a história que quando morreu o seu amigo e amante Hefestion, a sua dor ultrapassou os limites humanos, sendo os seus gritos espantosos e semelhantes aos da demência.
Ricardo Coração de Leão (1157-1199), rei de Inglaterra, homem de vontade indomá­vel, generoso e ousado, turbulento e impulsivo, trovador excelente e músico refinado, casado com Berenguela de Navarra, tinha condutas homossexuais eviden­tes.
Leonardo da Vinci, génio sólido e majes­toso, foi uma personagem curiosa e indeci­frável da qual se duvidou das suas tendên­cias reais, ainda que pela sua vida e costu­mes a história inclina-se para pensar que foi homossexual.
A Balada da prisão de Reading é um belíssimo e triste poema que escreveu na sua tormenta e prisão um dos homosse­xuais mais célebres e mais desprezados, Oscar Wilde (1854-1900), que ultrapassou os limites da heterossexualidade (casado com um amor compartilhado, com dois fi­lhos que amava muito) para apaixonar-se pelo Lorde Alfred Douglas, directamente responsável pelos anos cruéis de prisão que sofreu por uma sociedade intolerante e umas leis injustas.
Virginia Woolf (1882-1941), uma das maiores escritoras inglesas de todos os tempos, contemporânea de Joice e Law­rence, foi uma das inspiradoras do grupo de Bloomsbury, um mundo de inteligência que desafiou a moral vitoriana pela sua cultura, inconformismo e delicadeza. Casada com um homem que a amou activa e atentamente, o historiador Leonard Woolf, Virginia Stephen (o seu nome de solteira) era uma mulher com uma perso­nalidade magnética, mas desgraçada­mente afectada por profundas depressões que a levaram ao suicídio.
A mulher foi quase o único tema dos seus livros, que constituem um esplêndido mergulho psi­cológico no universo feminino; este inte­resse deu lugar a uma obra melódica, trá­gica e formosa. Virginia amou - espiritual e provavelmente fisicamente - outra grande escritora, Vita Sackwille-West, que tinha tendências homossexuais e estava casada com outro homossexual declarado, amor que inspirou uma das maiores novelas de Woolf, Orlando, obra que contém páginas duma beleza extraordinária.

Na figura (em cima). Na Grécia antiga, a relação sexual entre homens estava bem considerada e era totalmente aceite.


Com estes exemplos pretende-se demonstrar uma coisa que é uma realidade palpável: o comportamento homossexual existiu sem­pre e em todos os sítios. Não obstante, a atitude das diferentes culturas perante este comportamento foi e é muito diversa: desde a mais pura condenação até ao inci­tamento decidido, passando pela simples tolerância. A esta diversidade de atitudes há que acrescentar a sua escassa persistên­cia, já que, numa mesma cultura, mudam com o tempo até chegar, algumas vezes, a inverter-se totalmente.
A homossexualidade e Grécia antiga são duas palavras que estão unidas até ao extremo do mito. E mais do que homossexualidade poder-se-ia falar de pedofilia, o amor aos rapazes jovens, sobretudo nas classes intelectuais e dominantes. Assim o refere Licinio na sua obra Erotes, que con­tém uma excelente definição do conceito grego de amor: «O casamento é para os homens uma necessidade da vida e algo precioso, se é feliz; mas o amor dos moços, sempre que persiga os sagrados direitos do afecto, é, na minha opinião, resultado da verdadeira sabedoria. Por conseguinte, que o casamento seja para todos, mas o amor dos moços seja só privilégio dos sábios, já que uma virtude perfeita é total­ mente inimaginável para as mulheres.»

Na figura (em cima): Na Grécia antiga a homossexualidade era praticada normalmente e os jovens Efebos, como o representado nesta cerâmica, tinham grande aceitação entre os intelectuais e as classes dominantes.

No mundo antigo, incluindo Roma, os jovens (geralmente escravos) eram objecto de grande procura com fins homossexuais. Coisa muito distinta acontece com O Antigo Testamento, inspirador, em grande parte das ideias do cristianismo sobre o tema. Os severos mandamentos judaicos contra a homossexualidade e, em geral, contra toda a sexualidade, devem ser entendidos em grande parte como uma reacção dos dirigentes de um pequeno povo que lutava pela sua sobrevivência.
A interpretação das leis de Moisés está em grande parte baseada em conseguir tribos maiores e mais poderosas que mantives­sem o povo judeu forte contra os seus ini­migos. Nas suas condições, não se deve estranhar que considerassem necessário não desperdiçar o precioso esperma mas­culino, já que com isso se impediria o cres­cimento da tribo. Entendendo esta forma de pensar podem compreender-se as atitu­des hebraicas em relação à homossexualidade. Todas as manifestações homosse­xuais foram consideradas como indesejá­veis, sujas e como resíduos do desconside­rado paganismo anterior.

Na figura (em cima): Na Índia antiga, o contacto físico entre mulheres era considerado normal e saudável. As famílias ricas costumavam escolher uma ou mais companheiras para as suas filhas entre as jovens das classes mais humildes. Estas raparigas (sakhi) viviam com elas como se fossem "irmãs" e costumavam dormir na sua cama.

Além da condenação dos sodomistas, a Bíblia Sagrada sanciona com a morte a homossexualidade no Levítico, capítulo XX, onde se estabelecem os actos que devem ser considerados dentro da sodo­mia e diz-se: «Se um homem dorme com outro homem, como se faz com uma mu­lher, ambos cometem uma abominação e serão castigados com a morte. Que caia o seu sangue sobre eles.»
O cristianismo, pelo menos nos seus pri­meiros tempos, não sancionou com fortes penas nem castigou com a morte os que cometiam sodomia ou -as adúlteras, mas propôs a interiorização da ideia de pecado, através do auto controlo, em detrimento da sanção externa. Na mensagem de Cristo não se condena explicitamente a homosse­xualidade.
São Paulo, na sua Epístola aos Romanos, refere-se a esta, e condena tanto a mascu­lina como a feminina: «Por isto entregou­ -os Deus às paixões vergonhosas, porque, por uma parte, as suas mulheres mudaram o uso natural pelo que é contra a natureza. Igualmente por outra, também os homens, abandonado o uso natural da mulher, abraçaram-se na concupiscência de uns com os outros, homens com homens, cometendo coisas vergonhosas e rece­bendo em si próprios a devida recompensa do seu extravio». É aqui, onde pela pri­meira vez nos escritos cristãos se emprega a voz «contra a natureza», que logo será amplamente utilizada por alguns moralis­tas desde a Idade Média.
O imperador romano Justiniano (482-565) - já com o cristianismo triunfante­ decretou leis duríssimas contra os luxuriantu contra naturam, castigando a homos­sexualidade com a morte, da mesma forma que ocorria com o adultério.
Na figura (em cima): Quadro realizado em 1860 representando o cortejo que acompanhava os réus ao patíbulo depois de terem sido julgados pelos seus juízes.

Curiosamente, a Idade Média foi relati­vamente tolerante com a homossexuali­dade, quiçá porque o imperador Carlos Magno (742-814) não inventou novos casti­gos contra os homossexuais, mas mostrou- se claramente contra a homossexualidade, ainda que a tenha denominado «pecado» e não «delito».

Ao produzir-se a invasão árabe na Península Ibérica, os costumes muçulma­nos, que foram muito tolerantes com a homossexualidade, impuseram-se na Península. Mas a resposta não se faz espe­rar e, já desde o início da Reconquista, pro­curou-se implantar a diferente mentali­dade cristã. São Pelayo foi canonizado por não querer aceitar as exigências sexuais do califa Abderramán III, que o mandou matar por esse motivo.
Com a chegada de Afonso X o Sábio, ao iniciar-se a Baixa Idade Média, a dureza do castigo contra a homossexualidade foi exemplar: «Mandamos que quaisquer que sejam que tal pecado cometam, que logo se saiba, que ambos a dois sejam castigados perante todo o povo, e depois, ao terceiro dia, sejam pendurados pelas pernas até que morram, e nunca onde sejam tolhi­dos».
Na época de Eduardo II (1284-1337) o último monarca inglês medieval, aberta­mente homossexual, estendeu-se o comportamento homossexual. O mesmo Eduardo II foi deposto e assassinado. O castigo legal do comportamento homosse­xual conservou-se nas leis inglesas durante mais seis séculos com penas muito severas.
A Santa Inquisição ditou, na época dos Reis Católicos, leis contra o «pecado nefando». Entre elas há uma, de 22 de Agosto de 1497, com o título Da sodomia e Bestialidade, na qual se condena os autores deste delito que «não é digno de ser nome­ado» a «serem queimados em chamas de fogo», qualifica-o como heresia e crime de laesae majestatis e diz que «é merecedor das maiores penas que podem ser dadas por obra».
Na época do Renascimento - com o retorno às ideias e à estética clássicas - significou um certo respiro. A sexualidade estendeu-se como rasto de pólvora nas cidades renas­centistas italianas, tanto que a prostituição feminina passou um momento de crise porque os homens preferiam praticar o pecado «contra a natureza». Em Veneza, apesar de que as leis da Sereníssima Repú­blica castigassem a sodomia enforcando e depois queimando os culpados, afogando­-os nos canais ou então condenando-os a prisão perpétua, o governo chegou a inci­tar as prostitutas para que se exibissem mais para conseguir que os cidadãos dimi­nuíssem as suas inclinações para os prosti­tutos e jovens afeminados.

Na figura (em cima): Gravura que representa um bordel para homossexuais masculinos em Londres na época vitoriana.

No século XVII, a homossexualidade começou a ser considerada como um delito cometido por «dementes e pecadores». O século XVIII, o século das Luzes e da Ilustração apregoou a liberdade sexual e um culto ao hedonismo exacerbado, mas só para a nobreza ociosa, já que foram publicadas muitas leis e decretos para moderar a vida sexual do povo.
Na Amé­rica colonial os homossexuais eram, nos finais deste século, normalmente justiça­dos, mas as novas ideias liberais que vi­nham de França alteraram os costumes, e não as leis no que se refere ao castigo da homossexualidade e, apesar do dito ante­riormente, já era frequente a meio do século XVIII, não justiçá-los, conformando-se os juízes e inquisidores a enviá-los à prisão para que se expiassem as suas culpas.
«Viciosos», «delinquentes», «anormais», «bruxas» e «pecadores», os homossexuais esconderam-se como ratos durante sécu­los, fugiram, levaram (ainda nos nossos dias) uma vida dupla ou suicidaram-se.
Uma triste condição praticamente até aos nossos dias que pode ser resumida com um dos poemas da mencionada obra Balada de Oscar Wilde, que exemplifica a vergonha que deveria sentir a sociedade pelo seu passado histórico em relação à homosse­xualidade:
Também sei, e oxalá todo o mundo o soubesse,
que toda a prisão construída pelos homens
se edifica com tijolos de vergonha,
e cercam-na com barrotes para que,
aos homens, que os seus irmãos mutilam,
Cristo não veja.
O ano de 1869 é um marco na história da homossexualidade. Um médico húngaro chamado Benkert escreveu uma carta ao ministro de Justiça, descrevendo a história do exame racional da homossexualidade e argumentando que o Estado não deverá entrar nos quartos dos cidadãos. Benkert defendia o comportamento homossexual. A medicina, punha-se pela primeira vez ao lado dos homossexuais, ainda que algu­mas considerações de outros autores (Kre­epelin entre outros) já a tivessem introduzido entre as doenças psiquiátricas, o que de certa maneira era «libertador».
Podia-se considerar a prisão - prosse­guia Benkert - tratamento apropriado para soberanos como Carlos IX, Henrique II, Jaime I, o Papa Júlio II, Napoleão I, Luís XVIII ou Frederico o Grande? Ou para homens de letras e ciências como por exemplo Maquiavel, Miguel Angelo, Sha­kespeare, Mazzarino, Moliere, Newton, Wincklmann, Cambacéres, Byron, August Graf von Platen e Eugene Sue?
A lista só menciona figuras da era cristã mas, inclusive dentro dos seus limites, é óbvio que tem graves omissões. O seu pro­pósito poderia ter sido muito mais impor­tante acrescentando outros nomes (e Ben­kert observa que se poderiam acrescentar milhares a qualquer lista de homossexuais que efectuaram contribuições notáveis à civilização e cultura ocidentais). Entre eles recordemos Bacon, Eduardo II, Sir Walter Raleigh, Marlowe, Holderlin, Leonardo da Vinci, Cellini, etc. Se estas pessoas mereceram a prisão, concluía Benkert, «tudo o que nos contaram acerca da nossa história não é mais do que uma sarta de mentiras e futi­lidades».
Em 1897, formou-se na Alemanha a pri­meira organização em prol da liberalização homossexual. O seu nome era Comité Científico e Humanitário. Foi fundada por Hirschfeld, médico judeu que dedicou grande parte da sua vida ao estudo da sexualidade e da homossexualidade em geral. A partir de então iniciou-se na Ale­manha uma luta pela reforma das leis homossexuais e a integração na sociedade que, através de conferências, congressos e publicações, estendeu-se principalmente à Austrália, Países Baixos e Inglaterra.
A campanha abolicionista deste primeiro movimento de carácter reformista ou revisionista foi sustentada pelos partidos obreiros e, principalmente pelo líder social-democrata alemão August Bebel, e o socialista britânico Edward Carpenter.
Os nazis chegaram ao poder e os gabinetes do Comité Científico e Humanitário foram saqueados e incendiados pelas juventudes hitleristas; os principais líderes que não se puderam exilar foram detidos e iniciou-se uma verdadeira «caça às bruxas» de homossexuais, acusados ao mesmo tempo de comunistas, e enviados, marcados com um triângulo cor de rosa para os campo de concentração onde foram submetidos à mais cruéis experiências «científicas» e humilhações. Calculou-se em cerca de 250.000 os homossexuais exterminados nestes campos e, junto com os ciganos, foram os únicos grupos de sobreviventes que não foram indemnizados nem mencio­nados pelo governo alemão.
Enquanto tudo isto se passava na Alemanha de Hitler, na União Soviética, Estaline, fazendo eco das manifestações de Gorki, que pro­clamava que os homossexuais eram incom­patíveis com o socialismo por serem um produto típico de uma sociedade capita­lista e burguesa, iniciava também uma luta contra os homossexuais e suprimia a liber­dade sexual que reinava na União Sovié­tica desde que em 1918 Lenine tinha abo­ lido todas as leis antissexuais existentes na época czarista. Centenas de homossexuais foram enviados para a Sibéria, outros sui­cidaram-se e os restantes tiveram de se esconder ou exilar, como o grande poeta Mijail Kuzmin. Desta forma, o primeiro Movimento de Liberação Homossexual da história foi exterminado entre 1933 e 1935 pelos nazis da Alemanha e pelos estalinis­tas na União Soviética.
Sem embargo, até ao final da década dos sessenta, a prestigiosa «American Psychiatric Association» não eliminou da sua lista de doenças psíquicas a homossexualidade, que a medicina - e concretamente a psiquiatria - retirou oficialmente dos estudos sobre patologia mental e homossexuali­dade. Apesar disto continuam -noutras esfe­ras médicas- a existir hipóteses que tentam explicar, sobretudo, a homossexualidade exclusiva, «a de toda a vida».


A tomada de consciência: dos «gays»

A maioria das organizações homossexuais rejeitam o termo homossexual pela sua ori­gem médica e preferem o de «gay» (gay em inglês, gai em francês, gaio em italiano, etc.). Este termo de raiz provençal, tem na sua origem o significado de alegre, jovial, de vida festiva e dissipada, etc .. Outra opção, mais restrita, fê-lo equivalente a homossexual, mas a um homossexual que se reconhece como tal, que se aceita e luta para reivindicar os seus direitos.
Foi em 1969 nos Estados Unidos,
pela primeira vez na história, que os homosse­xuais como resposta a uma das frequentes rusgas policiais em alguns bares do gueto nova-iorquino, em vez de fugir enfrentaram-se e iniciaram uma batalha campal que durou um fim de semana e se saldou com vários feridos. Foi assim que nasceu o Gay Libertation Front que, com manifes­tações, reuniões, comícios e todo o tipo de demonstrações, se esten­deu por toda a União e passou para o Canadá e Porto Rico. Destes países, passou para a Argentina (Frente de Liberação Homossexual Argentina) e, atravessando o Oceano Atlântico, impôs-se na Grã Bretanha, Ale­manha, Benelux, Países Escandinavos, Itá­lia, França (neste país já tinha participado nos acontecimentos de Maio de 1968), Gré­cia e outros.
Assim, os homossexuais que se aceitam a si próprios (denominados «egosintóni­cos» em contraposição aos que não dese­jam continuar a sê-lo e/ou se sentem pro­fundamente desgraçados pela sua con­dição, que se denominam «egodistónicos») ainda que possam levar uma vida privada anónima e reservar as suas manifestações homossexuais na mais pura intimidade, podem desejar um reconhecimento aberto e um respeito dos seus direitos. Para isso agrupam-se em círculos sociais e políticos e adoptam o termo gay como etiqueta pre­ferida.


O que é ser-se homossexual
A homossexualidade define-se como a tendência e a conduta a reagir preferente­mente com companheiros do mesmo sexo. Este termo é aplicável tanto a homens como a mulheres, ainda que as últimas, como homenagem à poetisa Safo e à sua ilha Lesbos, são também denominadas de lésbicas.
O indivíduo ambissexual ou bissexual é aquele que se relaciona com companheiros de qualquer sexo, ainda que existam gra­duações que vão desde a heterossexuali­dade exclusiva até à homossexualidade exclusiva. No seu célebre relatório sobre a conduta sexual, Kinsey elaborou a sua teo­ria do continuum, segundo a qual, a con­duta sexual humana não está dividida em categorias claramente separadas e contrárias; homossexualidade e heterossexuali­dade não são compartimentos estancados, mas dois extremos do continuum no qual se pode situar toda a população, depen­dendo da sua maior ou menor atracção em relação a pessoas do próprio sexo ou do sexo oposto.
Kinsey idealizou a seguinte escala, divi­dida em seis pontos (mais um grau certo), que é útil para fazer uma classificação prá­ tica segundo a biografia sexual que apre­ sentam os indivíduos:
O) Exclusivamente heterossexual.
l) Relações e experiências quase total­mente heterossexuais, ainda que circuns­tancialmente possa ter relações com o mesmo sexo.
2) Preponderância de relação heterosse­xualidade ainda que responda a estímulos homossexuais e tenha experiências homos­sexuais ocasionais.
3) Bissexual na sua atitude.
4) Reage mais a estímulos homossexuais que heterossexuais.
5) Quase totalmente homossexual na sua reacção psicológica e, na prática, com con­tactos heterossexuais ocasionais.
6) Exclusivamente homossexual.
Do trabalho de Kinsey deduz-se a neces­sidade de diferenciar as pessoas cuja orien­tação e actividade são homossexuais, daquelas que têm uma conduta homosse­xual acidental. Como prática acidental, a homossexua­lidade é comum entre os que não são homossexuais. A pré-adolescência e a adolescência são períodos em que esta conduta é frequente, quase sempre motivada pela curiosidade. Durante a idade adulta estas práticas tornam-se menos comuns entre os indivíduos heterossexuais.
No entanto, existem situações especiais em que se incrementa esta actividade. Geralmente, qualquer situação de isola­mento social forçado, na qual as situações de relação com o sexo oposto diminuem, favorece a actividade homossexual: em prisões, internamentos, seminários e durante o serviço militar observa-se com alguma frequência o aumento do homosse­xualismo acidental. Uma pergunta que preocupa muito os pais é quando se começa a «notar» a homossexualidade, especialmente quando vêm que o seu filho ou filha adolescente passa uma época na qual parece que não se relaciona com membros do sexo oposto.
Em relação à resposta para pessoas do mesmo sexo, cabe distinguir a partir dos primeiros sentimentos, que podem passar desde uma simples amizade a converter-se em mais ou menos românticos e platóni­cos, até chegar ao desejo de contacto físico e, finalmente de contacto genital. Este pro­cesso costuma iniciar-se na adolescência e pode observar-se uma conduta distinta segundo o sexo. Referiu-se que a primeira relação sexual, geralmente, é já de tipo genital nos homossexuais masculinos, enquanto que nas mulheres é muito mais romântica ou afectiva, e não costuma incluir contacto genital, sem que por isso seja menos emocionante.
Também se viu, que principalmente na adolescência, os homens e mulheres ho­mossexuais apresentam uma resposta he­terossexual reflectida em sonhos, em fanta­sias e em condutas heterossexuais. Sem embargo, parece ser que estas condutas são frustrantes porque falta o componente emotivo e de autêntica atracção física que caracteriza as relações homossexuais nes­tes indivíduos. Por isso, o mais normal é que abandonem estas práticas, mas não por medo ou aversão ao sexo oposto, mas porque lhes resulta menos gratificante.

A gênese do homossexual

Os homossexuais com filhos costumam ter medo de que a criança siga o modelo de sexualidade do pai e adopte um estilo de vida homossexual. No entanto, as investi­gações indicam que isto não é assim e que tanto o desenvolvimento da criança como a sua identificação de género é indepen­dente da orientação sexual dos pais. Nem a hereditariedade nem os factores hormo­nais proporcionam uma explicação plausí­vel da homossexualidade. Um investiga­ dor alemão chamado Domer defendeu a ideia de uma falta de andrógenos no hipo­ tálamo nos homossexuais, antes do nasci­mento, e um excesso destes nas lésbicas.
Esta teoria, ainda que seja interessante, talvez não seja a única que explica a homossexualidade. Se fosse verdadeira, talvez o único que demonstraria seria uma «disposição» do cérebro dos homossexuais para aprender mais facilmente as práticas homossexuais e ser-lhes mais difícil man­ter uma conduta heterossexual.
A homossexualidade é uma tendência biológica comum a todos os mamíferos, in­cluído o homem; a aprendizagem - segun­do as circunstâncias em que tenha ocorri­do, as várias experiências e reforços emo­cionais que se tenham recebido - condicio­nará os diferentes padrões de conduta sexual, as distintas «tendências» e a forma que as mesmas podem tomar. Nas socieda­des restritivas esta tendência é reprimida e tende a ser extinta. O homossexual da nossa cul­tura fracassa parcial ou totalmente, segundo o quantum de homossexualidade na conservação do potencial biológico he­terossexual. Às vezes ainda é mais difícil encontrar as diferentes experiências que consolidaram uma conduta homossexual - sobretudo exclusiva - ainda que por ex­tensão se possa dizer o mesmo da heterossexualidade.
Nas origens da homossexualidade há tantas combinações possíveis, tal entrelace de atitudes, de reforços que assegurem a sua fiabilidade, que não é nada simples a tarefa de atribuir um valor mais forte que outro a uma diversidade de condiciona­mentos tão formidável.


Personalidades iguais, sexualidades distintas

Uma pergunta que se colocou frequente­ mente é se os homossexuais são doentes psiquiátricos. A resposta deve deixar claro que não o são. Não obstante, há que mati­zar esta rotundidade. Ainda que seja nor­mal encontrar patologia psiquiátrica entre os homossexuais, tem que se admitir que uma pessoa não pode viver na sua atmos­fera de rejeição geral de disfarce contínuo, numa sociedade que sanciona e prescreve as suas actividades e desejos, num mundo social que se burla e ri deles em cada momento, sem que a sua personalidade se veja fundamentalmente afectada.
Os homossexuais não possuem personalida­des diferentes dos heterossexuais: nem são mais susceptíveis, nem mais simpáticos, nem mais introvertidos, nem mais domi­nantes. Nada na sua forma de ser pode dis­tingui-los dos heterossexuais. Somente a sua angústia, o seu desgosto, a sua depressão quando não são aceites no seu âmbito familiar ou social.
Por outro lado, ainda hoje continua a ha­ver quem pense na possibilidade de «cu­rar» os homossexuais. Naturalmente, neste caso, o conceito «curar» é relativo, já que não estamos perante uma doença definida. Talvez fosse melhor utilizar o termo «mudar». De momento todas as técnicas utilizadas tiveram resultados muito distin­tos, sendo as de melhor prognóstico as ten­tadas com jovens muito motivados, mas inclusive com estes as estatísticas de «mudança» são decepcionantes. De facto, perante um homossexual pode-se optar por quatro tipos de terapias:
• Reduzir ou eliminar a tendência ho­mossexual e criar ou aumentar a heterosse­xualidade.
• Reduzir ou eliminar a tendência ho­mossexual sem alterar os seus desejos hete­rossexuais.
• Aumentar o desejo heterossexual sem modificar o homossexual.
• Melhorar a adaptação do sujeito à sua situação homossexual.
Consideramos que salvo em casos parti­culares muito concretos, é mais correcto aumentar o interesse e melhorar as relações heterossexuais do paciente, que fazê-lo sentir aversão pela sua situação homossexual.
Em qualquer caso, é crucial que o homem ou mulher homossexual acudam a um especialista que não considere a homossexualidade uma doença, um trans­torno ou uma carga onerosa. E sim - como costuma acontecer frequentemente - as téc­nicas de reaprendizagem fracassam, o tera­peuta deve tentar sempre a adaptação à homossexualidade, voltar «às origens» e procurar que o homossexual se aceite a si próprio e que a sua sexualidade não seja fonte de problemas, mas de satisfações.
Um dos maiores temores do homem ou mulher que descobre e confirma a sua homossexualidade é o de ter de enfrentar­ - se a esta publicamente: pensam que dar a conhecer à família, aos amigos e companheiros, as suas preferências, provocará efeitos negativos, mas a verdade é que cria muito menos do que os esperados a longo prazo. A sociedade actual é muito mais tolerante com a homossexualidade e quando assim não acontece, porque ainda existem pessoas que consideram «mal» os homossexuais, geralmente pode dizer­-se que se impõe a discrição.
O «ser co­nhecido» pode ter consequências menos devastadoras do que pensam e temem muitos homossexuais. Por exemplo, os profissionais de alto nível costumam ocul­tar mais a sua condição a nível social, mas não no seu pequeno mundo íntimo. Em conjunto, a homossexualidade afecta menos a vida social da mulher que a do homem. Mas enquanto que estas pensam que lhe é prejudicial porque as suas amiza­des se limitam demasiado a mulheres homossexuais, os homens homossexuais lamentam-se porque a sua condição priva­-os de uma vida em família.
O conhecimento por parte dos pais da homossexualidade do filho ou da filha costuma proceder de fontes exteriores e rara­ mente se fala disso. No que se -refere às raparigas, em metade dos casos a reacção dos pais é de aceitação e compreensão; os restantes repartem-se entre a irritação e a incerteza, ainda que com o tempo as coisas se acalmem e acabem por aceitá-lo. Padrões de vida dos homossexuais
Um estudo significativo (Bell e Weinberg, 1978) identificou os seguintes seis tipos de vida homossexual, que, de facto, não se diferenciam excessivamente dos padrões de vida das pessoas e casais heterossexuais.
Homossexuais em casal fechado
Vivem uma relação muito semelhante à de um casal convencional de tipo heterosse­xual, implicando esta um alto grau de exclusividade em termos de relações sexuais e interpessoais. É pouco frequente que procurem outros companheiros fora do casal, não costumam ter problemas sexuais e não lamentam a sua condição. Apresentam uma adaptação social muito boa e muito poucos problemas pessoais. Como grupo, são os que melhor aceitam a sua identidade e os mais felizes.
Homossexuais em casal aberto
Ainda que vivam uma relação de casal, não estão completamente satisfeitos e procu­ram outras relações. Representam o colec­tivo de homossexuais que mais se esforça por estabelecer novos contactos com inte­resses sexuais. Costumam ter uma intensa e variada actividade sexual e, ainda que geralmente mostrem uma boa adaptação social, não aceitam tão bem como os ante­riores a sua identidade. Esta é a forma de vida mais comum no caso dos gays, mas não nas lésbicas, que normalmente vivem em casais fechados.
Homossexuais funcionais
São os que não têm companheiro, e com­ partem a sua ampla experiência sexual com um grande número de homens, consi­deram-se com uma alta atracção sexual e têm poucos problemas deste tipo. Não lamentam a sua condição. Costumam tratar-se de indivíduos mais jovens que os pertencentes aos grupos anteriores, e são os que têm mais problemas sociais, como detenções ou discussões, devido à sua busca intensa de novos companheiros.
Homossexuais disfuncionais
Aproximam-se à imagem tradicional do homossexual atormentado. São pessoas que encontram uma escassa gratificação na sua vida, têm mais problemas sexuais que os outros grupos, lamentam-se da sua situação e costumam ser vítimas da maio­ria das extorsões sociais e conflitos, espe­cialmente laborais. É frequente que estes homossexuais, principalmente as mulhe­res, procurem ajuda psicológica para fazer frente aos múltiplos problemas que encon­tram na sua vida.
Assexuados
Mostram pouco interesse e escassa activi­dade pelo sexo, relacionando-se com muito poucos companheiros sexuais. Constitui o grupo que com menos frequência se mos­tra exclusivamente homossexual e são muito reservados. O seu padrão de vida é a solidão, tanto do ponto de vista social como sexual.
Homossexuais casados
Um caso aparte é o dos homossexuais que se casaram com um membro do sexo oposto (recordemos que o casamento reli­gioso não está permitido a um casal homossexual e, de momento os homosse­xuais só se podem casar civilmente em muito poucos países, como na Dinamarca, Países Baixos (Holanda), Espanha, Bélgica, Canadá, África do Sul e nos estados americanos de Massachusetts e Iowa.
Os homossexuais casados costumam ter mais problemas, devido a um índice maior de culpa, vergonha ou ansiedade em relação à sua homossexualidade. A sua permanente dupla vida chega a atormentá­-los tanto que acaba por produzir um con­flito psicológico que os leva inexoravel­mente à consulta com um profissional.
Não é verdade, tal como pensam alguns, que a maioria das lésbicas acabe por se casar, mas é verdade que o fazem mais do que os homens homossexuais (26% contra 18%). Adverte-se nestas a tendência a casar em idades mais jovens, talvez como forma de tentar acabar com a situação de conflito que lhes origina a sua situação sexual. Assim, mostram preferência por um companheiro de tipo passivo e pouco agres­sivo. Por último apresentam uma rejeição quase unânime à realização de um casa­mento por conveniência com um homem homossexual.
Outra crença muito difundida é que, ao contrário dos homens homossexuais, as mulheres homossexuais podem sentir-se satisfeitas com a relação heterossexual. Em linhas gerais deve-se dizer que isto não é assim. Somente quarenta por cento das mulheres lésbicas referem alguma reacção positiva perante a relação com homens, mas geralmente sentem-na como inade­quada. Entre os sentimentos negativos que acompanham as relações heterossexuais das mulheres lésbicas, cabe distinguir os seguintes: medo do dano físico durante o coito (não tão frequente como se poderia esperar), temor pela falta de atracção, temor à gravidez e hostilidade em relação aos homens. Falta referir que somente qua­tro por cento dá esta última resposta, pelo que devemos concluir que o tão aclamado «ódio em relação aos homens» é muito menor do que se supõe.

Homossexualidade feminina e masculina

Para muitas pessoas, a homossexualidade continua a ser sinónimo de homossexuali­dade masculina, como se a feminina fosse uma simples entelequia. Numa cultura de sinal marcadamente masculino não é estranho ouvir frases como esta: «Depois de tudo, o que podem fazer duas mulheres sozinhas?». Não obstante, desde tempos muito antigos encontram-se sinais velados de uma certa preocupação pela homosse­xualidade feminina, como nos Concílios de Paris e Rowen (1212 e 1214), nos quais se proibia que as freiras dormissem juntas.
No entanto, as diferenças entre homens e mulheres homossexuais são poucas. As mulheres costumam aceitar melhor a sua homossexualidade e têm menor pressão social neste sentido. Um estudo recente demonstrou que mais de metade dos homens homossexuais (56%) frente a 25 por cento das lésbicas, consideram que a homossexualidade tem alguma influência negativa na sua vida.
Outro factor de diferenciação é que as lésbicas se mantêm mais tempo com a mesma companheira, inclusive quando a paixão terminou, o que não nos deve sur­preender se temos presente que, para a lésbica, a escolha da companhia se baseia noutros factores além da atracção física, que é mais dominante no caso do homos­sexual masculino. Isto explicaria em parte porque as lésbicas têm menos medo de envelhecer que os homens homossexuais: catorze por cento dos homossexuais masculinos e doze das lésbicas confirmam que esta é uma das suas maiores preocupações. Detecta-se além disso, a diferença de que estes afirmaram que em idades avançadas estariam dispostos a pagar por ter relações sexuais, enquanto que estas não o estariam.
Como já se insinuou anteriormente, o homossexual masculino tem regularmente relações sexuais causais, sem que preceda nem siga nenhum outro tipo de relação pessoal, o que raramente acontece entre as lésbicas. Assim que também sejam menos abundan­tes os bares e outros estabelecimentos dedicados exclusivamente a estas.
Por outro lado, as lésbicas têm menos problemas de rejeição social. As ameaças ou a violência contra a mulher homosse­xual são raras, assim como as detenções por motivos sexuais (4% comparado com 37% dos homens homossexuais).
Isto deve-se à menor agressividade da mulher, a que esta é mais partidária de um período de galanteio e não de um contacto sexual imediato e a sua maior tendência a efectuar as suas práticas em privado. Tal­vez evitar os aspectos públicos explique o motivo pelo qual os grupos organizados de lésbicas sejam muito mais escassos e menos importantes que os de homosse­xuais masculinos.
Para concluir, não se pode deixar de mencionar que, tanto por razões anatómi­cas óbvias como por razões psicossocioló­gicas mais subtis, uns e outros fazem amor de maneira distinta. A quase totalidade das mulheres preferem uma estimulação prolongada, suave e periférica e, geral­mente, não são tão partidárias como os homens das carícias centradas directa­mente nos genitais. Deste modo, as carícias das lésbicas são de uma grande efectivi­dade e permitem obter elevados níveis de tensão sexual.
O facto de pertencer ao mesmo sexo possibilita uma intimidade quase perfeita e proporciona-lhes uma compenetração que lhes pode permitir «alcançar as estrelas». Não obstante, preci­samente por derrubar rápido as barreiras das quais de alguma maneira depende o fascínio sexual, o interesse das lésbicas pelo sexo (e também entre os homosse­xuais masculinos) costuma cair em seguida. De facto muitos casais de lésbicas renunciam aos seus contactos sexuais pas­sados dois ou três anos. Provavelmente, também se deva ao impulso sexual menos intenso que apresentam algumas mulheres.
Todavia, a menor duração da atracção sexual não se deve interpretar como um defeito fundamental destes casais, já que, por outra parte, são capazes de manter um alto nível de intimidade e satisfação pes­soal; definitivamente, de recompensas não sexuais quando a paixão se dissipou, o que não nos deve surpreender se temos em conta que para a lésbica a escolha da com­panheira não se baseia unicamente na atracção física.

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