Um grupo de arqueólogos mexicanos publicou uma série de ensaios sobre os costumes sexuais das civilizações pré-colombianas do México e da América Central, revelando segredos que permaneceram ocultos por quase 500 anos. Os documentos apontam para práticas que escandalizaram os espanhóis, que chegaram à região no século 16.
O conceito de sexualidade dos habitantes originais das Américas era muito diferente do europeu, que tinha uma visão moral e religiosa sobre o tema. Nas culturas mesoamericanas (como eram conhecidas as civilizações indígenas da região que vai do centro do México à América Central), o sexo era um elemento de ordem social, explica Enrique Vale, editor da revista Arqueologia Mexicana, que publicou os ensaios.
"A sexualidade ia além da função reprodutiva, era vista como uma maneira de assegurar a marcha do mundo", disse Vale à BBC.
Salão secreto
Durante centenas de anos, as práticas sexuais das civilizações mesoamericanas foram praticamente ocultadas, e mesmo na época moderna o tema foi abordado sob um ponto de vista moral.
Em 1926, por exemplo, o antropólogo Ramón Mena reuniu uma mostra de esculturas fálicas e outros objetos das civilizações pré-colombianas que faziam referência à sexualidade.
A coleção, no entanto, nunca foi aberta ao público e permaneceu escondida durante várias décadas em um salão secreto do antigo Museu Nacional de Antropologia na Cidade do México.
Muitas peças eram falsas, mas as que tiveram sua legitimidade confirmada foram distribuídas depois em mostras das diferentes culturas pré-colombianas.
Rito de passagem
Os ensaios publicados na revista Arqueologia Mexicana revelam, por exemplo, que a homossexualidade era uma prática comum na civilização maia. Este era um elemento a mais na formação dos jovens, explicam os antropólogos Stephen Houston e Karl Taube no ensaio "A sexualidade entre os antigos maias".
"As relações entre pessoas do mesmo sexo eram próprias do tempo dos ritos de passagem, em que um menino se transformava em um homem", explicam. A homossexualidade está presente em quase todas as culturas pré-colombianas, mas foi abordada de maneiras diferentes pelas diferentes civilizações.
Por exemplo, entre os astecas, que dominavam a região central do que é hoje o México, as relações entre pessoas do mesmo sexo não eram bem vistas. Este elemento se refletia também nas divindades pré-colombianas, muitas das quais tinham, em maior ou menor escala, aspectos femininos e masculinos, explica o historiador Guilhem Olivier em seu ensaio "Entre o pecado nefando e a integração. A homossexualidade no México antigo".
Masturbação ritual
Em algumas culturas, a masturbação era um tema vinculado à fertilização da terra. Os maias, como outras civilizações mesoamericanas, praticavam a masturbação como uma maneira de fecundar a terra, que em algumas civilizações era considerada um símbolo feminino.
"Há indícios de que os maias tinham objetos sexuais de madeira, usados como consolos e descritos pudicamente em um relatório arqueológico como uma efígie fálica", afirmam.
A atitude frente à masturbação é uma das práticas que torna mais evidente a diferença entre as culturas pré-colombiana e espanhola, diz Vela. Há ainda outro elemento: em algumas culturas mesoamericanas, o erotismo não era um elemento central na sexualidade, mas era visto como uma forma de ordenar o planeta, que tem um lado feminino e um lado masculino, assim como existia o em cima e o embaixo, afirma o editor.
Fogo e sal contra os adúlteros
Em termos gerais, as transgressões sexuais eram castigadas com severidade nas culturas mesoamericanas. O adultério, por exemplo, era castigado com a morte em algumas civilizações, e em outras, como a dos astecas, permitia ao marido traído arrancar a mordidas o nariz dos adúlteros.
Os purepechas tinham outro castigo: no caso dos adúlteros terem assassinado o marido, o amante era queimado vivo enquanto água com sal era jogada sobre ele até sua morte.
O adultério era castigado por uma forte razão: em algumas culturas, acreditava-se que a prática causava desequilíbrio para a comunidade e o cosmos, destacam Miriam López e Jaime Echeverría em seu ensaio "Transgressões sexuais no México antigo".
A presença do transgressor provocava desgraças, como a perda de colheitas ou a morte de crianças, e em alguns casos chegava-se a acreditar que ela poderia provocar o fim de uma época.
Como exemplo, eles citam que o líder asteca Moctezuma destruiu um local de prostituição, porque acreditava que as transgressões públicas das prostitutas teriam feito com que os deuses permitissem que os espanhóis chegassem e impusessem seu domínio.
Fonte BBC